terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Acerto entre governo e oposição leva a uma CPI Mista dos Cartões

Valor Online




BRASÍLIA - Os entendimentos entre o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) e o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), em torno da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista para investigar o uso dos cartões corporativos do governo Luiz Inácio Lula da Silva - com brecha para apuração da Conta Tipo B existente desde o governo Fernando Henrique Cardoso - dividiu a base aliada e a oposição. O acerto em um requerimento propondo a instituição de uma CPI mista (composta de deputados e senadores) para apurar o uso abusivo do cartão corporativo, e também para investigar a aplicação dos recursos destinados ao Suprimento de Fundos (cartão corporativo mais conta B ) desde 1998, na gestão de FHC, quando o cartão foi criado.




Jucá havia proposto uma CPI exclusiva do Senado, para mostrar que o governo não tem medo de investigação . Já havia protocolado seu requerimento, mas foi obrigado a recomeçar do zero, por causa de rasuras no texto. O acordo com Sampaio é vantajoso para o governo, que terá direito a indicar presidente e relator. Esses cargos são ocupados pelos maiores partidos de cada Casa - PMDB no Senado e PT na Câmara. Se fosse exclusiva do Senado, as funções seriam divididas entre governo e oposição. Sampaio viu vantagens no acordo: Prefiro uma CPI chapa branca (com presidente e relator governista) a uma CPI exclusiva, da Câmara ou do Senado. Por que a sociedade e a imprensa acompanham muito mais o dia-a-dia de uma CPI mista. A imprensa fica em cima. A CPI mista é o pior palco para se falar em acordo visando abafar a investigação , diz ele.




Os senadores do DEM e do PSDB, que não foram consultados previamente, e setores da oposição na Câmara interpretaram o entendimento como suposto acordão para blindar Lula e FHC de qualquer investigação. Querem fazer uma CPI de fato indeterminado. É impossível investigar dez anos de gastos com Suprimento de Fundos. É para não investigar nada , disse o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).




Imitando Dinarte Mariz (ex-senador), não sei o que há por trás, mas que há qualquer coisa, há , afirmou Heráclito Fortes (DEM-PI). Para o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), o governo está tentando embaralhar os fatos. Eventuais crimes alheios não absolvem os cometidos agora , disse.




Em defesa de Sampaio, o presidente tucano, Sérgio Guerra (PE) - que havia sido consultado pelo deputado -, relatou no plenário ter conversado com FHC. O ex-presidente havia dito que a CPI pode investigar seu passado, presente e futuro . Segundo Guerra, FHC afirmou que a investigação não tem capacidade de intimidá-lo .




Em São Paulo, entretanto, FHC disse considerar arbitrária a decisão de parlamentares da base do governo de ampliarem para o ano de 1998 a investigação. Segundo FHC, não há fato determinado que justifique investigações sobre anos anteriores aos atuais problemas no uso dos cartões corporativos. Em primeiro lugar, não tenho nenhum problema (na apuração dos gastos). Mas do ponto de vista da Constituição, é preciso haver um fato determinado , declarou o ex-presidente. Ele mencionou o artigo 58 da Constituição, que autoriza o Congresso a instalar comissões parlamentares de inquérito para a apuração de fato determinado e por prazo certo .




O líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), não concordou com a iniciativa de Jucá. Tentou convencer Sampaio a incluir na ementa do requerimento de forma explícita que o governo FHC seria investigado. Achou que o texto estava muito oposicionista. Não posso colocar na ementa que a investigação começará em 1998, porque não há fato determinado. Mas é inevitável que a investigação chegue à ? Conta B ? , na gestão do governo Fernando Henrique , justificou Sampaio.




Ele argumenta que decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) estabelece que as CPIs podem abrir investigações em relação a fatos correlatos, não especificados no requerimento. Os cartões vieram substituir as ? contas B ? . Essa relação vai gerar outras investigações , disse o tucano.




Sampaio estava coletando assinaturas para uma CPI mista, com o objetivo de apurar abusos envolvendo autoridades e servidores atuais - um deles causou a demissão da ex-ministra Matilde Ribeiro (Igualdade Racial). A partir do acordo com Jucá, ele alterou a introdução, incluindo a informação de que os cartões foram criados pelo decreto 2809-98 e instituído a partir de 2001.





Antes dos cartões, as despesas emergenciais e eventuais do governo eram pagas por meio de contas bancárias ( Tipo B ). Os servidores autorizados podiam sacar o dinheiro ou emitir cheques. O uso do cartão deixa o registro eletrônico da transação, que é divulgado por meio do Portal da Transparência (www.transparência.gov.br) - exceto as protegidas por sigilo, como as da Presidência e órgãos de inteligência. Hoje, além dos cartões, ainda existe a Conta B



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O líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO), convidou o senador Neuto de Conto (PMDB-SC) para presidir a CPI dos cartões corporativos. Raupp, que esteve ontem em Santa Catarina fazendo pessoalmente o convite, afirmou que a escolha do nome de Neuto se deu por sua respeitabilidade junto à bancada. Sabemos que é uma missão difícil, mas todas que ele têm desempenhado estão indo bem , disse Raupp, afirmando que o catarinense teria 48 horas para dar a resposta. Segundo ele, o partido ainda não teria um segundo nome caso Neuto não aceitasse.




Neuto de Conto não deu resposta ontem. Disse apenas que não é só querer ser presidente da CPI, é preciso ter tempo para desempenhar bem a tarefa, encontrar o norte do processo e a orientação para o uso do bem público , afirmou, comentando que a CPI não pode levar mais que 90 dias. Ele disse ainda ver a indicação como uma missão e não como uma distinção.




(Raquel Ulhôa | Valor Econômico. Colaborou Vanessa Jurgenfeld, de Florianópolis)



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