segunda-feira, 8 de junho de 2015

Monólogos de uma alma sem rumo




Numa parábola, Jesus contou a seguinte história de um fazendeiro rico: “O campo de um homem rico produziu com abundância. E arrazoava consigo mesmo, dizendo: Que farei, pois não tenho onde recolher os meus frutos? E disse: Farei isto: destruirei os meus celeiros, reconstrui-los-ei maiores e aí recolherei todo o meu produto e todos os meus bens. Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e regala-te” (Lc 12.16-19).
Aquele homem adorava um monólogo, arrazoando consigo mesmo e tomando as decisões que lhe convinham. E parecia que ninguém estava a notá-lo nem a ouvi-lo. Mas Deus, que o observava, lhe disse: “Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?”
Penso que a mensagem de Jesus procura chamar a atenção para o fato de que somos o que pensamos. Os monólogos, os solilóquios da alma, falam mais alto que os discursos públicos. Portanto, quando alguém está a falar consigo mesmo, não está simplesmente “pensando alto” apenas, mas, principalmente, está revelando o produto interno do seu coração. Se os pensamentos são maus, a pessoa será má; se os pensamentos são puros, a vida da pessoa será pura.
Pode parecer esquisitice alguém falar sozinho. Mas isso é mais comum do que parece. Certo homem, quando indagado por que sempre conversava sozinho, respondeu: “Tenho dois motivos: primeiro, porque gosto de ouvir uma pessoa inteligente falar. Segundo, porque gosto de falar com uma pessoa inteligente”.
De fato, em todo lugar podem ser vistas pessoas que andam pelas ruas profundamente entretidas em seus solilóquios, como se travassem discussões sérias. Não é difícil encontrar crianças falando sozinhas, ou que têm “amigos secretos” que nada mais são que elas próprias. Há quem recorra a práticas excêntricas, como a “terapia do espelho”, quando a pessoa fala consigo mesma, cara-a-cara diante do espelho, e o “eu” derrama a alma diante de “mim”.
O que importa, afinal, não é só o que as pessoas falam quando conversam consigo mesmas. Importa mais saber que não se pode mentir para si próprio. Mesmo que trave uma luta interna de si para si, quando o “eu” que quer fazer o bem se contrapõe ao “eu” que quer fazer o mal, a consciência estará lá como um implacável “juiz”.
Paulo expressou bem isto em sua carta aos Romanos: “Porque nem [eu] mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois [eu] não faço o que [eu] prefiro, e sim o que [eu] detesto. Ora, se [eu] faço o que [eu] não quero, [eu] consinto com a lei, que é boa” (Rm 7.15). Incluímos o sujeito oculto [eu] no texto original para indicar que, na briga dos dois “eu” internos, na medida em que consinto com a lei, acabo me tornando o meu próprio juiz.
O que converso comigo mesmo fala mais de mim do que aquilo que falo de mim mesmo a outras pessoas. Eu me descubro mais a mim mesmo quando me contraponho comigo mesmo no espelho da minha alma do que o faço quando falo de mim a outras pessoas.
Jesus sabia disso muito bem. Está escrito que Jesus “não precisava de que alguém lhe desse testemunho a respeito do homem, porque ele mesmo sabia o que era a natureza humana” (Jo 2.25). Por isso Ele fazia perguntas e esperava a resposta, ou seja, que a pessoa saísse de seu “casulo” existencial, para depois curá-las de suas mazelas.
Como Ele conhecia essa predisposição humana de conversa do “eu-comigo”, foi contundente quanto à essência desses monólogos. Ele disse: “O homem bom do bom tesouro do coração tira o bem, e o mau do mau tesouro tira o mal; porque a boca fala do que está cheio o coração” (Lc 6.45).
O que é conversado na intimidade do “eu-comigo” revela o que está em cada coração. Podem ser coisas boas, coisas ruins, coisas sábias, coisas tolas, coisas saudáveis, coisas doentias. O resultado é determinado pelo que está no íntimo, no coração. E muitas vezes os monólogos revelam o rumo da alma, ou almas que não têm rumo algum.
Jesus alertou para o fato de que uma oração egoísta – aquela que se presta a achar defeitos nos outros, em vez de assumir suas próprias falhas – é um simples monólogo. Ele falou a respeito de um fariseu que “orava de si para si mesmo”, enquanto se louvava e acusava a outro homem “pecador” que estava nas proximidades (Lc 18.9-11). Sua alma estava trancada em si mesma, sem rumo, num monólogo vazio, sem perspectiva alguma de amar ao próximo ou de se aproximar de Deus. O resultado é que o “outro” foi justificado diante de Deus, não ele. O fariseu gostava apenas de ouvir sua própria voz e dar razão a si mesmo pela vida vazia e sem sentido que levava.
Não deixe a sua alma vagando sem rumo em monólogos intermináveis. Fale consigo, pergunte a si mesmo como está a sua situação diante de Deus. Pergunte-se onde passará a eternidade. Pergunte a sua alma se você precisa de Deus. Deixe o “eu” responder a verdade. Depois, fale com Deus sobre isto. Ele ouvirá você e o ajudará a encontrar “em Jesus” o rumo certo para sua vida.



Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém



sexta-feira, 22 de maio de 2015

O que faria Jesus?



 
 
 
Sabemos que a comunicação é vital para qualquer relacionamento, quer seja entre pais e filhos, marido e mulher, treinador e atleta, empregador e empregado etc. E, precisamos reconhecer, mais importante do que tudo – entre Deus e Seus filhos amados. Durante toda a Sua vida aqui, Jesus deixou claro, pelo Seu exemplo, a importância dessa comunicação, sendo registrado nos evangelhos cerca de vinte ocasiões em que ele orou ao Pai celeste.
Jesus orou em diferentes circunstâncias: após ser batizado no rio Jordão (Lc 3.21); durante pequenas pausas em Seu ministério (Lc 6.12); antes de ressuscitar Lázaro, já sepultado há quatro dias (Jo 11.41). Além disso, Ele também orou por diversas razões: buscando direção para os próximos passos (Lc 6.12,13); expressando o Seu desejo de fazer a vontade do Pai (Mt 26.39); e para agradecer pela comida (Jo 6.11), entre outras.
Em sabendo disso, uma lição ressalta-se diante de nós: se Jesus precisava comunicar-se com Deus para cumprir a Sua missão, quanto mais nós precisamos orar!
Mesmo Jesus sendo um homem de oração, não consta em nenhum lugar nos evangelhos que Ele ficasse insistindo para que os discípulos orassem. Ele simplesmente orava, fazia a Sua parte. Até que, um belo dia, depois que Seus discípulos o observaram em intensa oração, então lhe pediram: “Senhor, ensina-nos a orar”.
Foi então que Jesus lhes ensinou o “Pai Nosso”, a oração mais conhecida, apreciada e utilizada em toda a civilização cristã. Ela é dita por santos e pecadores, nas horas de aflição ou de alegria, lamentando ou festejando, em um jogo de futebol ou celebrando um aniversário, ou simplesmente como uma espécie de amuleto protetor.
Embora todos conheçam o “Pai Nosso”, devemos reconhecer que não poucas vezes somos tentados a deixar de ver as suas implicações subjacentes. Ou ainda, podemos estar com os olhos espirituais de tal modo embotados, que não enxergamos o óbvio da coerência de vida requerida da pessoa que se aproxima de Deus com tal modelo de oração.
Gostaria de tecer algumas considerações sobre as cobranças implícitas de cada sentença dessa oração, identificando a coerência de vida fundamental requerida para dar sentido e pertinência ao que oramos. Portanto...
Quando eu digo: “Pai” — Isso significa que devo demonstrar diariamente minha relação de filho de Deus.
Quando eu digo: “nosso” — Significa que não posso viver num compartimento espiritual como se no céu estivesse reservado um lugar especial só para a minha igrejinha.
Quando eu digo: “que estás no céu” — Significa que não devo me ocupar apenas em ajuntar tesouros na terra, descuidando-me do que tem valor eterno.
Quando eu digo: “santificado seja o teu nome” — Significa que devo procurar santificar-me, pois sou chamado pelo Seu santo nome.
Quando eu digo: “seja feita a tua vontade” — Significa que não posso ficar ressentido e desobediente em relação à vontade de Deus para comigo.
Quando eu digo: “na terra como no céu” — Significa que devo me preparar para dedicar a vida ao Seu serviço.
Quando eu digo: “dá-nos hoje o pão nosso de cada dia” — Significa que não posso viver como se não fizesse questão de obter aqui e agora o que necessito.
Quando eu digo: “perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também perdoamos aos nossos devedores” — Significa que não devo guardar rancor contra nenhuma pessoa.
Quando eu digo: “não nos deixes cair em tentação” — Significa que não devo ficar deliberadamente me expondo à tentação ou colocando-me onde provavelmente poderei ser tentado.
Quando eu digo: “livra-nos do mal” — Significa que devo me preparar para lutar no reino espiritual com as armas da Palavra de Deus e da oração.
Quando eu digo: “teu é o reino” — Significa que devo conceder ao Rei a obediência disciplinada de um súdito fiel.
Quando eu digo: “teu é o poder” — Significa que não devo temer o que os homens me possam fazer, ou o que as pessoas possam pensar de mim.
Quando eu digo: “tua é a glória” — Significa que não posso ficar buscando, como os fariseus, ser glorificado pelos homens.
Quando eu digo: “para sempre” — Significa que não posso limitar o meu horizonte pelas coisas do tempo, mas focar-me na eternidade.
Quando eu estou disposto a encerrar a oração dizendo “amém” — Significa que preciso acrescentar também “custe o que custar”, porque Jesus ensinou que esta oração equivale honestamente a consagrar tudo a Deus.
Jesus, o Filho de Deus, precisava orar. Nós também! Oremos sempre, na certeza de que, como dizia John Wesley, um cristão de joelhos vê mais longe do que um filósofo na ponta dos pés.
Pense no que terá de enfrentar hoje. Se, de algum modo, você quiser perguntar: “O que faria Jesus?” – baseado em Seu exemplo, você pode ter certeza de que Ele oraria primeiro. E, se você desejar imitá-lo nisso, bem o fará.
 
 


Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém