Hillary Clinton, Barack Obama e John Edwards mostram ares de celebridades.
Competição revela divisões culturais e temáticas de campanhas, candidatos e eleitores.
Do New York Times
As aparições públicas da senadora Hillary Rodham Clinton não são agendadas como algo convencional como "comícios", "encontros públicos" ou "discursos". Nos últimos dez dias, Clinton tem presidido eventos chamados "Pais e Mães Fazendo História", "A Hora de Escolher um Presidente", "Trabalhando por Mudanças, Trabalhando por Você", "A Hillary que eu Conheço" e "Cada Condado Conta".
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Ela raramente nomeia seus principais concorrentes à nomeação presidencial Democrata, mas a presença deles paira no ar. "Algumas pessoas acham que você pode ter esperança por mudanças", declarou ela em um evento recente, numa farpa dirigida ao senador Barack Obama, de Illinois. "Algumas pessoas acham que você pode apenas exigi-la", acrescenta ela, numa estocada contra o ex-senador John Edwards, da Carolina do Norte. "Eu acredito que você faz mudanças trabalhando muito, muito duro", declarou Hillary antes de iniciar um resumo de seu currículo.
Enquanto Obama, Clinton e Edwards tentam (de forma bastante educada) atacar um ao outro nos últimos dias antes dos encontros em Iowa na quinta (3), o sabor e a substância de seus desempenhos competitivos revelam uma divisão básica, cultural, temática e estilística em suas campanhas, seus correligionários e eles mesmos. O último zigue-zague de Obama por Iowa é apresentado apenas como turnê "Manifeste-se por Mudanças". Mas poderia muito bem ser chamado de "Turnê eu Não sou a Hillary" ("E nem sou o John Edwards, também").
Suas referências aos rivais são constantes e muito pouco veladas: tornar-se presidente, afirma ele, não tem sido sua "ambição de longa data" (o que se suspeita tanto em relação a Clinton quanto a Edwards); e não é, diz ele, algo a ser desejado "desde o jardim da infância" (como uma referência da ridicularização de Clinton retratada como criancinha); o país está cansado "dos mesmos argumentos e pessoas de sempre", afirma Obama.
E ele reconhece, sarcasticamente, que as pessoas dizem que talvez ele não seja agressivo o suficiente – numa referência a Edwards, cuja declaração em alto volume de que está numa "luta épica" contra "interesses arraigados" marcou sua última passagem pelo Iowa, também chamada de turnê "América se Erguendo: Lutando pela Classe Média".
Mas há semelhanças: eles viajam com grandes cortejos, prometem "defender você" em Washington (ao mesmo tempo em que pedem aos eleitores que "me defendam" na quinta (3) à noite) e parecem estar precisando de uma (ou 10) boa noite de sono. Mas suas diferenças são mais reveladoras e, em última análise, refletem as diferentes idéias de mudança que os candidatos buscam encarnar.
Os eventos com diversos nomes diferentes de Clinton mostram uma candidata que se esforça para convencer os eleitores que um conjunto de qualidades aparentemente contraditórias pode co-existir numa única candidata: que ela é uma figura totalmente familiar; que é agente de mudanças; que ela já viveu na Casa Branca, mas que sua eleição seria histórica e sem precedentes; que ela é alguém durona, mas de quem se pode gostar. Os eventos de Edwards são barulhentos, se não forem sempre os mais lotados (Obama conseguiu superá-lo em 900 a 300 em dois comícios em Davenport na sexta-feira (28).
O som áspero da música "Our Country" ("Nosso País"), de John Mellencamp, marca suas chegadas um pouco tardias. Ele usa palavras belicosas (utilizou a palavra "luta" 22 vezes em 40 minutos no sábado (29) de manhã), conta histórias (sobre as surras de fazer sangrar o nariz que ele levou e deu quando garoto) e metáforas (os eleitores devem "enviar um lutador para a arena").
"Eu dou boas vindas ao seu ódio", disse Edwards sobre os "arraigados interesses", citando Franklin D. Roosevelt. Sua platéia, pesadamente composta por "meus irmãos e irmãs que fazem trabalho organizado" têm mais chances de começar com palavras de ordem espontâneas. Ele foi aplaudido de pé longamente em Davenport, que começou por sua esposa Elizabeth, que estava sentada atrás dele, enquanto alguns eleitores mais velhos tapavam os ouvidos.
Obama se apresenta como o novo rosto definitivo, sem as marcas da experiência de que Clinton alardeia como sua principal qualidade. Ele chega de lugar nenhum, faz uma entrada espetacular no palco e tende a se dirigir ao público como uma única unidade cívica ("Olá, Marshalltown"), como um rock star faria. Seus eventos são ligeiramente mais desordenados do que os dos outros candidatos. Eles atraem gente mais jovem, muitos com adesivos de Obama nas costas, em vez dos adesivos menores colados na lapela dos que apóiam Clinton.
Crianças pequenas são mais comumente vistas nos eventos de Obama, às vezes entrando em áreas proibidas, como nos suportes das câmeras. Os eventos de Clinton são planejados de maneira ordenada e meticulosa e às vezes parecem até mesmo majestosos. Ela fica de pé com as mãos na cintura enquanto espera para falar, ela normalmente fica perto de sua filha, Chelsea, que em semanas recentes a tem acompanhado em silêncio, as mãos posicionadas em perfeita simetria com sua mãe.
Ao ser apresentada por um correligionário no Guthrie Center na última quinta-feira (27), Hillary e Chelsea Clinton estavam encostadas ombro a ombro, segurando uma a outra. Tendo agentes do Serviço Secreto ao seu lado, a Senadora de Nova York fala mais longe da platéia do que Obama, mas também passa mais tempo sorrindo e posando depois. Hillary tem uma tendência a usar a frase "quando eu for presidente", em vez de "se eu for eleita". Ela prefere o pronome "Eu", enquanto Obama usa mais o "nós" e Edwards o "eles". De certo modo, os pronomes escolhidos pelos candidatos refletem sua mensagem variada.
O "Eu" de Clinton é um representante de sua mensagem de experiência. Ela é meticulosa em comunicar sua sucessão de conquistas – todas as coisas "pelas quais batalhei" – até assuntos triviais, como ajudar vítimas de danos cerebrais traumáticos, aumentar o acesso à saúde pública para doenças mentais e ajudar os fazendeiros que plantam maçãs em Nova York, sendo que um deles, Mark Nicholson, apresentou-a no Guthrie Center. "Clinton". Hillary foi ao microfone, agradeceu a ele profusamente e o elogiou por "produzir frutas maravilhosas e expandi-las para que se transformem em sucos". As pessoas viajam longas distâncias para seus comícios, tanto para ver uma celebridade quanto para conhecer um candidato.
Hillary é quem, de longe, recebe mais pedidos de autógrafos de fotos. Antes de sua chegada, a multidão no Guthrie Center fez um "Jogo de Trivia da Hillary" na qual os competidores foram desafiados em diversas questões sobre a vida da candidata ("Em que faculdade Hillary estudou?"). Os vencedores sortudos ganharam uma camiseta da "celebridade". A campanha pela união de Obama se reflete em seu uso de "para nós" e "nós", o chamado novo tipo de política. Seu "nós" é constituído pela prospecção de uma coalizão com qualquer um disposto a mudar o sistema político – em vez de "jogar o jogo" dentro desse sistema, numa referência tácita aos Clintons e seu domínio sobre a política.
"Em vez de enviar alguém a Washington para jogar o jogo, precisamos de alguém que mude o plano desse jogo", declarou Obama. "Nós não somos uma nação dividida como sugerem nossos políticos". Enquanto ele começa a falar mais especificamente sobre o tema, a crítica de Obama a Clinton vai se tornando mais simples. Ele afirmou que deliberações sobre a saúde pública não deveriam acontecer "nos bastidores", numa referência à iniciativa abortada de Clinton nos anos 90, pela qual ela foi atacada por ter sido sigilosa em excesso. Ele se compromete a convidar a C-Span a transmitir suas deliberações sobre saúde pública, o que resulta numa de suas declarações mais confiáveis e sustentadas a merecer aplausos.
Obama gosta de alardear que já conquistou "algumas das partes mais vermelhas de Illinois" a caminho de sua posição de senador, assim como Hillary evoca sua bem-sucedida campanha junto a eleitores republicanos no norte do estado de Nova Iorque e suas colaborações com republicanos no Senado. Edwards se comprometeu a forjar uma coalizão bipartidária pela vitória unida contra as forças do mal dos "outros": aqueles que defendem "a ganância corporativa", "os lobistas de Washington e as PACs de interesses especiais", e grandes executivos que recebem bônus de "empresas de petróleo, empresas farmacêuticas e companhias de seguros".
"Eles se infiltraram em tudo", grita Edwards, sua mão direita um punho cerrado em torno do microfone. Ele tem o dom de invocar uma raiva fresca, apesar de já ter feitos essas reclamações muitas vezes. "Eles têm um punho de ferro que segura nossa Democracia. Nós temos que retirar o poder deles".
Quando as aparições públicas de Edwards mudam de temas emocionais e populistas para assuntos internacionais mais pesados, os ambientes ficam consideravelmente menos barulhentos. Em Davenport, Edwards respondeu a uma pergunta de uma mulher que elogiou sua mensagem, mas o desafiou a "dar a ela um pouco de substância" quando o assunto era política externa.
Como parte da resposta, Edwards descreveu uma conversa telefônica que teve com o presidente do Paquistão, Pervez Musharraf no dia em que Benazir Bhutto foi assassinada. Edwards disse que incentivou Musharraf a "continuar com o processo de democratização" do Paquistão e a permitir uma investigação independente do assassinato de Bhutto. "Nós também falamos sobre a importância das próximas eleições", declarou Edwards, referindo-se, presumivelmente, ao Paquistão, não a Iowa.
Tradução: Luiz Marcondes
do site:
http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL243231-5602,00.html
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