sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Domingos sem Glória Maria

Depois de quase uma década, a apresentadora deixa o posto de apresentadora do ‘Fantástico’

Ivan Marques


A partir do próximo domingo, o Fantástico estará diferente. Após quase uma década apresentando o programa, a jornalista Glória Maria chegou a um acordo com a Rede Globo, depois de oito meses de negociação, e terá dois anos de férias. A emissora emitiu nota oficial na tarde de anteontem, e ainda confirmou Patrícia Poeta como substituta de Glória, a partir de janeiro. Renata Ceribelli apresentará o último Fantástico de 2007.


De acordo com a própria, o período “sabático” servirá para que ela se dedique a projetos pessoais que não puderam ser realizados durante o tempo em que se dedicou à revista dominical. Glória quer viajar pelo mundo sem compromisso, tomar aula de canto, gravar um CD e escrever um livro. Em entrevista a diversos sites, a apresentadora atesta que não houve qualquer desentendimento com a Globo e que o motivo para sua saída é o cansaço.


No entanto, comenta-se que as críticas recebidas incomodavam bastante à jornalista e que a queda da audiência do Fantástico também contribuiu para as férias. As desavenças com Renata Ceribelli e com Pedro Bial, esta última negada por Glória, também contribuíram para a insatisfação e o desgaste no programa. A Rede Record estaria interessada em contratá-la, mas a emissora paulista negou ter entrado em contato com a apresentadora.


Com 35 anos de carreira, Glória Maria é um marco no jornalismo brasileiro. Começou no RJTV, passou pelo Bom dia Rio, pelo Jornal Hoje, Jornal nacional e Globo repórter, até chegar ao Fantástico, em 1998. Foi a primeira repórter negra na tevê, primeira a apresentar uma matéria ao vivo e em cores (para o Jornal Nacional) e, recentemente, a primeira a fazer uma matéria para a televisão digital no Brasil. Mulher, negra e de origem pobre, a jornalista passou por problemas com o governo durante o período militar e ainda foi a primeira repórter do sexo feminino a cobrir a Guerra das Malvinas, em 1982.


Em nota oficial da Rede Globo, Patrícia Poeta afirmou que “ninguém pode ocupar o lugar da Glória Maria. Ela é uma personalidade, criou um jeito, um estilo único na televisão”. A gaúcha de 31 anos já participava do Fantástico como repórter internacional em quadro com matérias baseadas em estudos e pesquisas recentes sobre a vida conjugal.
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Rumo aos novos tempos


Em 2007, as emissoras de tevê brasileiras viveram um ano de transições. E isso não se limita à chegada da HDTV, ou a televisão de alta definição, que no dia 2 de dezembro foi transmitida pela primeira vez no Brasil. A Record investiu pesado na dramaturgia, nos shows e no jornalismo, cooptando grandes profissionais da TV Globo e arriscando-se em novos conceitos e temáticas. Com isso, conseguiu permanecer – mesmo que esporadicamente – em primeiro lugar.


Novas idéias estavam por trás desse destaque, como exibir numa novela a violência cotidiana das favelas das grandes cidades. O personagem Jacson, vivido por Heitor Martinez em Vidas opostas, da Record, é um marco da teledramaturgia, pela violência ilimitada e por suas complexas relações com outros moradores da favela. Há cada vez mais dificuldades em criar personagens inteiramente bons ou maus, quando na própria vida fica difícil definir onde começam e onde terminam categorias morais. O Olavo, de Wagner Moura em Paraíso tropical, da Globo, era um sórdido vilão. Mas também era muito divertido. E a Bebel, de Camila Pitanga, era uma ladra, prostituta e mentirosa. Mesmo assim, irresistível.


Essas transformações na dramaturgia parecem acompanhar mudanças ainda mais profundas na maneira de ser e de viver no Brasil. Seria muito improvável há alguns anos – e até hoje é – que uma novela sobre mutantes pudesse ser exibida. Pois Caminhos do coração, também da Record, não apenas mantém um bom ibope, como aponta para novos enredos e novos espectadores. A audiência é cada vez mais segmentada e a idéia da família reunida em torno do aparelho de televisão tornou-se uma melancólica imagem do passado.

O desinteresse de grande parte da juventude pela tevê a favor de games e bate-papos na internet, horários de trabalho que avançam noite adentro e engarrafamentos na volta para casa em grandes cidades põem em xeque a própria grade de programação das emissoras, congeladas em um formato que hoje parece ultrapassado.

No caso do SBT, uma das mais sólidas redes de tevê brasileiras, a chegada aos 80 anos de Silvio Santos leva a uma reflexão sobre o futuro da emissora, erguido à imagem e semelhança de seu criador. E a estréia de mais uma rede estatal de televisão também obriga a sociedade em geral a repensar para que e a quem serve afinal uma emissora de televisão. (Mauro Trindade/TV Press)

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