quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Medo escondido em Myanmar










População fala em dezenas de detenções em Yangun, durante a noite














As forças de segurança de Myanmar fizeram esta noite dezenas de interrogatórios em Yangun. Durante o recolher obrigatório, a polícia passou a pente fino a zona do Pagode de Shwedagon - ponto de partida dos protestos das últimas semanas.

















Durante os protestos de 24 de Setembro, os manifestantes foram filmados e fotografados, sendo agora, muitos deles, detidos."Temos de nos esconder. Aderimos às manifestações de uma forma muito pacífica. Não sei o que se passa, mas temos de nos esconder. Espero que as coisas voltem ao normal dentro em breve", contou à AFP um habitante de Yangun, sob anonimato.













"Em termos visuais, Yangun voltou ao normal, mas creio que as tensões são subjacentes e o medo continua lá", indicou por outro lado Charles Petrie, o mais alto representante da ONU em Myanmar.













A China aplaudiu, entretanto, os esforços do enviado das Nações Unidas no sentido de impedir a repressão, pelo Governo, dos protestos, reiterando o apelo para que os generais se contenham no impedimento dos mesmos.













O enviado da ONU, Ibrahim Gambari, reuniu-se com o general Than Shwe, bem como a opositora do regime Aung San Suu Kyi, durante a visita de quatro dias a Myanmar.














Luta pela democracia














República independente desde 1948, Myanmar é governada com pulso de ferro por uma Junta Militar, há 45 anos. No poder em 1962, com um golpe militar, os generais assumem os destinos do país (ainda com a designação Birmânia). Ne Win inaugura o que classifica como “a via birmanesa para o socialismo” – nacionaliza a economia, cria um Estado unipartidário e extingue a imprensa independente. Está instalada a ditadura.













Aung San Suu Kyi é a face visível da oposição ao regime, desde o final dos anos 80, quando a população acorda de um estado letárgico de 26 anos, desde o início da ditadura de Ne Win. Quase 30 anos depois do golpe militar de 62, o general convertera um dos países mais prósperos da Ásia num dos mais pobres do Mundo.













Nas universidades, começam os primeiros protestos pró-democracia, detonados pela degradação da economia. Agosto de 1988 fica registado na História, com centenas de estudantes a morrer às mãos da repressão militar contra as manifestações, em Rangun.













Conscientes da febre revolucionária que se vive no país, os generais convocam eleições livres, mas sem imaginar a dramática derrota que esperava o regime: A Liga Nacional pela Democracia (LND) conquista 396 dos 485 assentos parlamentares. Ainda assim, os militares negam-se a transferir o Governo. A Junta Militar permanece, ilegalmente, no poder. É redigida uma nova Constituição e os deputados eleitos da LND constituem um Governo no exílio. Em 1989, a Junta adopta a designação de Myanmar, em vez de Birmânia.













Em 1991, Aung San Suu Kyi, líder da LND, símbolo internacional da resistência pacífica e filha do general Aung San – herói da independência - recebe o Nobel da Paz, sob prisão domiciliária que se prolonga até à actualidade. Em 2006, é pela primeira vez permitido o contacto internacional de Suu Kyi, numa entrevista com o enviado especial das Nações Unidas.













“A revolução de açafrão”













Os protestos começaram em Agosto deste ano, num movimento contras as duras medidas económicas impostas pelo regime – que eleva em 500 por cento o preço dos combustíveis (petróleo e gás). Centenas de activistas são presos. Em Pakokku, um grupo de monges sai às ruas reclamando democracia, recebendo como resposta a agressão do Exército (em Myanmar, os monges - cerca de 400 mil - são tradicionalmente venerados, pelo que a sua participação nos protestos tem um peso significativo).













O gesto do regime indigna religiosos e população civil. É exigido ao Governo um pedido de desculpas mas, findo o prazo dado para o efeito, os monges saem às ruas, apoiados por milhares de civis. A cor das suas túnicas apelida a revolução que encabeçam de “revolução de açafrão”.













Com o passar dos dias, as marchas de protesto budistas ganham politização, com elementos da Liga Nacional pela Democracia entre os manifestantes. Entre 50 a cem mil pessoas saem às ruas de Yangun. O Exército ameaça recorrer à força. Monges e população resistem, desafiando o regime repressivo de mais de quatro décadas.





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