Votação legislativa de janeiro, para a qual pesquisas indicavam derrota do governo, seria suspensa por 2 anos
Islamabad
Após ignorar os pedidos dos EUA e decretar estado de emergência no sábado, o governo do presidente Pervez Musharraf afirmou ontem que as eleições legislativas do Paquistão, marcadas para janeiro, devem ser adiadas. “A data das eleições possivelmente será alterada por causa do estado de emergência”, disse o primeiro-ministro paquistanês, Shaukat Aziz.
Aziz declarou em entrevista coletiva que o mandato do atual Parlamento poderia ser prorrogado por mais um ano, até que novas eleições sejam convocadas. Líderes da oposição estimam que o prazo para convocar novas eleições pode ultrapassar dois anos.
A declaração do estado de emergência e a suspensão da Constituição ocorreram às vésperas de o Tribunal Supremo do país julgar a validade da vitória de Musharraf nas eleições de outubro, quando o presidente foi eleito indiretamente para mais um mandato de cinco anos pelo Parlamento.
Sua candidatura, no entanto, estava ameaçada pelo Judiciário, já que a legislação paquistanesa não permitiria que ele concorresse enquanto ocupasse o cargo de comandante das Forças Armadas. Musharraf havia prometido deixar o comando militar se fosse eleito, o que não ocorreu.
Outra hipótese para o endurecimento do regime do presidente Musharraf seria exatamente a proximidade das eleições legislativas de janeiro. De acordo com as últimas pesquisas, o governo perderia a maioria parlamentar.
Musharraf justificou o estado de emergência e a suspensão da Constituição do país alegando que o Paquistão enfrenta uma onda de violência por parte de grupos extremistas.
No mesmo dia, o presidente do Tribunal Supremo, Iftikhar Chaudhry, declarou a medida inconstitucional. Horas depois, em resposta aos juízes que se opõem ao governo, o presidente destituiu Chaudhry e nomeou o juiz Abul Hameed Dogar como novo chefe do Judiciário paquistanês. Chaudhry, inimigo declarado de Musharraf, foi preso com outros oito magistrados.
A repressão oficial se estendeu a líderes da oposição. O presidente interino da Liga Muçulmana do Paquistão, Javed Hashmi, também foi preso ontem - ao lado de cerca de dez ativistas da legenda liderada do exílio pelo ex-primeiro-ministro Nawaz Sharif - deposto por Musharraf em 1999.
Imran Khan, ex-capitão da seleção nacional de críquete e líder do partido Tehreek-e-Insaf, foi posto em prisão domiciliar ainda na noite de sábado depois de denunciar a prisão de jornalistas. O premiê Aziz reconheceu que cerca de 500 pessoas haviam sido presas em todo o país, mas não quis comentar sobre quanto tempo duraria o estado de emergência no Paquistão.
ESTADO DE EXCEÇÃO
Todas as redes de televisão privadas de Islamabad tiveram suas transmissões interrompidas. Ontem, a polícia paquistanesa percorreu os estúdios das tevês para confiscar equipamentos.
Jornais impressos e sites na internet estão proibidos de divulgar informações que “difamem, exponham ao ridículo ou atinjam a reputação” do chefe do Estado, dos membros das Forças Armadas ou dos órgãos Executivo, Judiciário e Legislativo. O sistema de telefonia também entrou em colapso.
A ex-primeira-ministra Benazir Bhutto, que negociava um acordo político com Musharraf, retornou ao país no sábado - ela havia deixado o Paquistão para visitar parte da família nos Emirados Árabes. Embora tenha dito que a medida era uma “regressão à ditadura”, Benazir afirmou que só fecha um acordo Musharraf caso o governo restabeleça a Constituição e organize eleições livres.
AP, REUTERS, NYT E AFP A ESCALADA DA CRISE
9 de março - Presidente paquistanês, Pervez Musharraf, suspende o presidente da Suprema Corte, Iftikhar Chaudhry, sob alegação de conduta imprópria. Juristas unem-se a favor de Chaudhry, um crítico do presidente, e a popularidade de Musharraf cai em meio a crescentes manifestações por democracia
10 de julho - Após um cerco militar de dez dias, Musharraf ordena a invasão da Mesquita Vermelha, em Islamabad, para conter radicais islâmicos que usavam o local como base. Pelo menos 105 pessoas são mortas. A ação é seguida por uma onda de atentados a bomba
20 de julho - A Suprema Corte reintegra o juiz Iftikhar Chaudhry, abalando a autoridade de Musharraf
27 de julho - Musharraf se encontra com a exilada ex-premiê Benazir Bhutto em Abu Dabi para discutir como conduzir o país até a democracia. Benazir exige que o presidente deixe o posto de chefe do Exército. As conversas são inconclusivas
10 de setembro - Nawaz Sharif, o primeiro-ministro que Musharraf depôs e forçou ao exílio há oito anos, é detido no aeroporto de Islamabad quando voltava ao país e enviado para a Arábia Saudita. A Suprema Corte, que havia possibilitado a volta de Sharif, abre ações contra o governo por ter desrespeitado sua decisão
2 de outubro - Musharraf designa o ex-diretor-geral do serviço secreto como seu sucessor para o cargo de chefe do Exército. Governo anuncia que está retirando as acusações de corrupção contra Benazir, abrindo caminho para que a ex-primeira-ministra retorne do exílio
Nenhum comentário:
Postar um comentário